(Portal Acrítica)
Promotora
pede bloqueio dos bens, no valor de R$ 2,6 milhões, da secretária e do
subsecretário da pasta e da construtora. Perito afirmou haver um suposto
esquema para abafar casos de obras asfálticas irregulares no interior
Contrato da Seinfra para execução de obras de terraplenagem,
pavimentação e drenagem das ruas do Município de Codajás tinham prazo
inicial de quatro meses, mas, com aditivos, chegou a três anos de
execução. Na foto, Waldívia Alencar
O
Ministério Público do Estado (MPE) pediu o bloqueio de R$ 2,6 milhões
de bens em nome da secretária estadual de Infraestrutura Waldívia
Alencar, do secretário executivo Roberto Honda e da construtora Ponctual
num processo em que um perito afirmou haver um suposto esquema, na
Seinfra, para abafar casos de obras asfálticas irregulares no interior
do Amazonas.
A
ação civil pública por improbidade administrativa, assinada pela
promotora de Justiça Neyde Regina Trindade, chegou à Terceira Vara da
Fazenda Pública do Fórum Henoch Reis, no dia 30 de junho. No dia
seguinte, o juiz de direito Everaldo da Silva Lira determinou que os
três acusados sejam notificados para apresentarem defesa prévia, o que
ainda não ocorreu.
O
processo trata de irregularidades na execução de um contrato, no valor
de R$ 6.197.330,61, firmado entre o Governo do Estado, por meio da
Seinfra, e a Ponctual, em 2009, para serviços de terraplenagem,
pavimentação e drenagem de 13,892 Km de ruas na sede do Município de
Codajás (a 240 quilômetros de Manaus).
Laudo
da engenheira Daniela Lucena, da Seinfra, aponta que foram executados
11,627 Km, sendo que 2,011 Km desconsideram normas técnicas; 7,908 Km
estavam em bom estado de conservação; 3,483 Km necessitam de tapa
buraco; e 2,491 precisavam de remoção de material imprestável. Na
avaliação do MPE, 43,07% da obra, o que equivale a 5,984 Km, precisam
ser feitos ou refeitos. No Sistema de acompanhamento de obras do Governo
do Estado (Sicop) esse contrato é dado como fora do prazo/expirado.
O
MPE ressalta que, do total contratado, a secretaria pagou R$
6.151.531,86, que correspondem a 99,26% da obra, apesar de ter
verificado in loco que apenas 82% dos serviços foram realizados. “Há um
descompasso entre o avanço físico (82%) e o avanço financeiro (99,26%), o
que indica que a construtora recebeu a maior. Segundo, a utilização de
material de baixa qualidade, como a massa asfáltica e o solo para
terraplenagem, que indiscutivelmente reduziram os custos da empresa em
detrimento da qualidade final do serviço. Por último, restou demonstrado
que a construtora recebeu por serviço não executado, como no caso em
que apenas recapeou as ruas apesar de ser contratada para realizar,
também, o serviço de terraplenagem”, diz um trecho da ação do MPE.
Esquema
Chama
a atenção, na denúncia, o depoimento prestado pelo engenheiro
Glaupércio Castelo Branco, nomeado pela Seinfra, a pedido do MPE, para
emitir laudo pericial sobre a obra. O perito afirmou, em audiência na
sala do subprocurador para assuntos administrativos do MPE, em Manaus,
que o subsecretário da Seinfra, Roberto Honda, teria determinado que os
resultados do relatório das análises das amostras de asfalto deveriam
ser ocultados dele.
Disse
que, com o objetivo de encobrir as falhas dos trabalhos realizados pela
construtora e pela falta de fiscalização da Seinfra, ele teria sido
proibido de retornar a Codajás para terminar os testes asfálticos.
Afirmou que foi coagido a assinar um relatório com o consultor jurídico
da secretaria sem o devido respaldo técnico. Disse que a Seinfra possui
estreitas ligações com a construtora Ponctual e que o dono da empresa,
Paulo Machado, seria “tratado como um príncipe”, na secretaria, sem a
fiscalização efetiva em suas obras, com a anuência da secretária.
O
engenheiro contou ao MPE que “há ordens de abafar os casos de obras
asfálticas irregulares no interior do Estado do Amazonas, a cargo da
Seinfra, como aconteceram em Anori, Tapauá, Maraã, Pauini e Canutama”.
Disse que Waldívia falou a ele que confiava em sua habilidade técnica
para que o resultado da perícia “não respingasse na secretaria”.
Aditivos de prazo
Um
dos problemas apontados pelo MPE na execução das obras viárias em
Codajás foi a ampliação do prazo original do contrato. A previsão
inicial era de quatro meses. Mas com os 13 aditivos de tempo concedidos
pela Seinfra, que totalizaram 1.080 dias, saltou para três anos de
realização.
“A
contratada e a secretaria simplesmente afirmam que num lapso temporal
de três anos não houve sequer 120 dias úteis consecutivos de condições
climáticas favoráveis à execução de serviços de terraplenagem,
pavimentação e drenagem. Mas ainda, afirmam que na região há uma
alternância repentina entre seca e cheia, tratando-se de fenômeno
climático até o momento desconhecido pela comunidade científica, pois
destoa do conhecido e milenar sistema climático Amazônico”, diz o MPE.
Outro
problema, segundo o MPE foi a baixa qualidade da massa asfáltica
empregada no recapeamento das ruas. A deficiência foi atestada em
laboratório, segundo depoimento do engenheiro Glaupércio. “Os corpos de
prova deram todos negativos (...) Corpos de prova são as amostras do
asfalto que eles jogaram nas ruas, eles têm que dar 300 kg/cm2, é o
indíce. Quando rompeu, uma deu 60 kg/cm2 e outra deu 100 kg/cm2”.
Contradição em relatórios
O
MPE aponta, na denúncia, a contradição dos relatórios assinados pelo
engenheiro Inaldo Pereira dos Santos, da Seinfra, sobre a obra. Esse
profissional atuou como fiscal do projeto e depois comandou a comissão
de recebimento do empreendimento.
Quando
atuava como fiscal de obras, ele emitiu, em junho de 2010, relatório
referente a 3ª, 4ª e 5ª medições da obra por meio do qual certificou o
pagamento de 92,18% do contrato e a realização de 90% da obra. “Em março
de 2012, quase dois anos depois, agora como presidente integrante da
comissão, o mesmo engenheiro elaborou Relatório de Fiscalização da Obra,
no qual afirma ser o avanço financeiro de 99,26% e o avanço físico de
R$ 75,44%”, diz um trecho da ação por improbidade.
Maior
coerência apresentaram os relatórios elaborados pela engenheira Daniela
Lucena, também da Seinfra, entre março e outubro de 2012. No primeiro,
referente à fiscalização de 6 a 9 de março, ela constatou que 75,4% da
obra tinham sido feitos e 99,2% do contrato pago. Nos outros três
laudos, ela aponta a realização de 82% da obra e os mesmos 99,26% de
pagamento e cita diversas irregularidades. O recebimento da obra foi
negado pela Seinfra até a correção das pendências.
Sem retorno
O
MPE afirma, na ação, que pediu a indisponibilidade dos bens da
secretária estadual e infraestrutura, Waldívia Alencar, porque, como
ordenadora de despesa, a ela cabia o dever zelar pela observância dos
princípios constitucionais, assim como assegurar a correta utilização
dos recursos públicos. A promotora ressalta que os aditivos que
ampliaram em 1.080 dias o contrato, autorizado pela secretária, “além de
não garantir a total execução da obra, contribuiu, ainda, de forma
decisiva para a baixa qualidade dos serviços executados”, diz trecho da
ação.
Para
a MPE, não há, no parecer do fiscal da Seinfra, dados técnicos que
justifiquem a ampliação do prazo da obra em nove vezes. Ressalta que é
flagrante o erro de gestão. “As inúmeras provas constantes dos autos
demonstram indubitavelmente os erros inescusáveis de gestão e
fiscalização da obra, o descaso com a coisa pública, bem como a ciência
inequívoca da secretária a respeito das diversas irregularidades na
execução do contrato, atuando, inclusive, dolosamente para encobri-las”,
afirma o MPE.
A
CRÍTICA ligou para o telefone da secretária no sábado e ontem. O
aparelho estava fora da área de serviço. As chamadas para a assessoria
dela não foram atendidas.
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