(portal G1)
Os concursos públicos carecem de uma legislação geral que possa nortear
todos os envolvidos: candidatos, administração, bancas examinadoras.
Nesse sentido, o Projeto de Lei do Senado número 74/2010 poderia ser um
alento, e vem ao encontro das mudanças políticas clamadas pelo país, no
sentido de mais transparência e respeito pelo cidadão – no caso
específico, os candidatos. O projeto, como já é praxe em nosso sistema
legislativo, teve uma tramitação demorada no Senado e agora está na
Câmara. Mas será que o PLS 74/2010, quando for transformado em lei, será
a solução?
Infelizmente, não. Porque o projeto de lei só terá efeitos concretos
para os concursos federais e os candidatos continuarão sujeitos a uma
colcha de retalhos legislativa, com muitas lacunas, quando forem
prestar concursos estaduais ou municipais. No máximo, o PL 74 poderá
servir de parâmetro para outras leis mas, ainda assim, cada unidade da
federação precisará editar a sua própria lei de concurso.
Isso porque a União não pode definir regras para realização de
concursos em outras esferas sem ferir o princípio da autonomia, já que
não há previsão constitucional para isso.
A solução? Seria necessário uma PEC (projeto de emenda à constituição)
que incluísse competência para a União legislar sobre normas gerais
relativas a concurso público para as administrações públicas diretas,
autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, a
exemplo do que já acontece em relação a licitação e contratos (artigo
22, XXVII). Somente nesse caso os candidatos poderiam, finalmente, ficar
submetidos a um único diploma legal - independentemente do concurso a
ser prestado - e ter a necessária segurança jurídica, essencial para
quem investe tanto no projeto de se tornar um servidor público.
Enquanto isso não acontece, os candidatos precisam observar qual tipo
de concurso estão prestando, se federal, estadual ou municipal, para
saber a qual legislação – se houver – estarão submetidos.
No dia 6 de novembro, a presidente da República enviou ao Congresso Nacional mais
um projeto de lei sobre concursos públicos – que deverá ser examinado e
votado em regime de urgência - , desta vez tratando da obrigatoriedade
de cotas para negros nos concursos da esfera federal
Conheça o histórico do PLS74/2010
O projeto, de autoria do ex-Senador Marconi Perillo, data de
23/03/2010. Foi criado com a ementa “Cria regras para a aplicação de
concursos para a investidura em cargos e empregos públicos no âmbito da
União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal” e recebeu o
apelido ambicioso de Projeto da Lei Geral dos Concursos.
Já na origem (26/05/10), o Senador Tião Viana emitiu relatório
apontando a inconstitucionalidade da proposta e opinou pela rejeição do
mesmo.
Posteriormente, o projeto passou às mãos do senador Rodrigo Rollemberg,
que também reconheceu vícios que levariam à inconstitucionalidade do
mesmo, mas, em razão da necessidade da existência de uma lei para reger
os concursos públicos, optou por apresentar um substitutivo ao projeto
original, em vez de simplesmente rejeitá-lo. Assim, a nova proposta
altera a ementa e o artigo 1º, no sentido de valer apenas para concursos
públicos na administração direta e indireta dos Poderes da União.
Na tramitação, o projeto sofreu algumas emendas até chegar ao texto
final, passando inclusive por uma audiência pública, à qual compareceram
representantes de alguns segmentos ligados aos concursos públicos.
Atualmente está na Câmara dos Deputados, onde tramita sob o número PL
6004/2013, aguardando votação.
Cabe ressaltar que o projeto está apensado (para exame conjunto) ao PL
252/2003, que também trata de concursos públicos. Este, por sua vez,
está apensado a outros 21 (pasme!) projetos de lei que também versam
sobre o mesmo tema, abordando diversos aspectos dos concursos públicos,
sob os mais variados pontos de vista. Será preciso um bocado de
habilidade e vontade política para desatar esse nó.
O que muda
De toda forma, o PLS74/10, quando efetivamente transformado em lei, vai
consolidar em texto legal muitos aspectos que até o momento só eram
garantidos pela via judiciária, resultando em mais transparência e
segurança jurídica. Isso, além de reduzir custos para os candidatos, vai
desonerar o judiciário de uma enorme quantidade de ações. Outro aspecto
é que nem todo candidato dispõe de recursos para ingressar em juízo,
comprometendo, no fim das contas, a democracia pretendida com os
concursos públicos.
Assim, mesmo não sendo a panaceia para todos os males, o exame e
aprovação do projeto (agora PL 6004/2013) na Câmara é urgente e
necessário, considerando-se que os concursos federais são os que
movimentam um maior número de candidatos em todo o país, chegando, em
alguns casos, a 1 milhão de inscritos.
Conheça alguns dos principais pontos do projeto
1) Proíbe concurso para cadastro de reserva (sem oferta de vagas) ou com oferta simbólica de vagas (menos de 5% do quadro).
2) Prazo mínimo de 90 dias entre o edital e a prova.
3) Proíbe que a instituição contratada delegue a organização do concurso para terceiros.
4) Qualquer cidadão poderá impugnar o edital, mesmo não sendo candidato.
5) Prevê indenização aos candidatos em caso de anulação de concurso.
6) Provas escritas objetivas deverão ser aplicadas em pelo menos 1 capital por região que registre mais de 50 inscritos.
7) Permissão para que a candidata grávida possa realizar a prova física
até 180 dias após o parto, sem ser excluída do concurso.
8) Anulação de questões, alterações de gabaritos e resposta a recursos terão de ser fundamentadas.
9) A contratação de terceirizados ou temporários para exercer funções
relacionadas a cargos para os quais existam aprovados em concurso dentro
do prazo de validade – mesmo em cadastro de reserva – gera para os
mesmos o direito à nomeação/contratação.
10) Valor máximo da taxa de inscrição de 3% do salário inicial do cargo
– este aspecto foi considerado polêmico, pois o valor é elevado para os
candidatos que, via de regra, estão em dificuldades financeiras e ainda
precisam se inscrever em mais de um concurso até conquistarem a
aprovação.
*Lia Salgado, colunista do G1,
é fiscal de rendas do município do Rio de Janeiro, consultora em
concursos públicos e autora do livro “Como vencer a maratona dos
concursos públicos”
Nenhum comentário:
Postar um comentário