(portal Acrítica)
A CRÍTICA publica, a partir deste domingo, uma série de quatro reportagens sobre o perfil do eleitor amazonense. Nesta primeira matéria, eleitores que fazem parte de um grupo de 1,3 milhão (com pouca ou nenhuma instrução) falam o que pensam sobre o ato de votar
“O
político que quiser comprar meu voto pode botar qualquer dinheiro...
Vender pra quê? Pra mim não vale à pena. O político que faz uma coisa
dessas é um canalha, um canalha! A pessoa que aceita ainda é pior que
ele porque o voto não vale dinheiro nenhum”. O desabafo é da vendedora
ambulante de frutas Doralice Souza, 40, que há 25 anos trabalha no
Centro de Manaus. A vendedora faz parte do universo de 58,6% eleitores
amazonenses com baixa ou sem nenhuma escolaridade, que são analfabetos,
sabem apenas ler e escrever, ou que cursaram até o ensino fundamental.
Doralice,
que cursou até a 5ª série do ensino fundamental, conta que sua rotina
de trabalho dura mais de 12 horas por dia. Em meio às dificuldades, a
vendedora afirma que ainda tem esperança na política e que o voto é um
exercício importante para a cidadania. “Desde a Copa, estou meio perdida
com muito trabalho e não tive tempo de analisar as propostas dos
candidatos porque chego muito tarde em casa. E é preciso muita atenção
para ver o que eles propõem, ficar muito atenta”, pontua.
Sem
nunca ter sentado em uma carteira escolar, a camelô Maria da Conceição
Ferreira, 59, afirma que a eleição é a hora de dar o troco no político
que só promete. “Eles só aparecem aqui, nas nossas casas, no tempo da
eleição, e agora é que é a hora de dar o troco neles”, afirma. “Só
precisam da gente quando querem voto”, avalia a baiana, radicada em
Manaus há três décadas. Para Maria Conceição, a compra de votos é uma
“sujeira”. “Mas, eu acredito que o voto pode mudar as coisas e é um
jeito de dar um troco. Não é não? Porque nós somos muito enganados”,
afirma.
Já
o flanelinha Carlos Vieira, 49, que cursou até a 3ª série do ensino
fundamental, afirma que não se ilude mais com os políticos locais.
“Todos os anos eu voto. Mas, não adianta votar nesse pessoal. Bem dizer,
tudo fica só na promessa. Lembro pra quem votei pra presidente e
governador só, porque pra deputado votei em branco. Não dei meu voto
para nenhum desses que estão aí”, conta.
Apesar
de o percentual de eleitores com esse grau de escolaridade ter
diminuído em relação às eleições de 2010 (caiu de 65,8% para 58,6%), a
quantidade de pessoas nessas condições aptas a votar ainda representa
mais da metade do eleitorado do Estado. Em todo o Amazonas são 2,2
milhões de eleitores este ano. Desses, 1,3 milhão não chegaram a cursar o
ensino médio.
Pouco instruído, eleitor vende voto
Atingidos
diretamente pelas más escolhas políticas, trabalhadores pobres e com
pouca instrução acabam cedendo, por necessidade, a trocar votos por
favores, como deslocamentos para hospitais da capital ou pagamento de
tratamentos de saúde, principalmente.
A
vendedora Rosiane Oliveira, 30, que cursou até a 5ª série do ensino
fundamental, exemplificou: “Teve um político que ofereceu ajuda para eu
fazer uma operação. É claro que as pessoas às vezes vendem voto por
dinheiro mesmo, rancho, óculos, mas porque precisam. No meu caso, o
político não pagou nada, só prometeu ajuda e me decepcionei porque desde
lá até agora nada”, disse.
O
carregador Edson Rodrigues, 49, que cursou até a 2ª série do ensino
fundamental, condena essa prática. “A pessoa tem que votar em quem
quiser e não se vender. Se vender é se rebaixar, porque R$ 100, R$ 200
não dura a vida toda e o cabra eleito tem quatro anos de mandato pra
trabalhar e acaba não fazendo é nada, e o cara que vendeu o voto não vai
viver quatro anos com R$ 100”, disse. Ele, porém, comentou que não se
lembra em quem votou nas eleições de 2010. “E ainda não decidi em quem
eu vou votar agora”, disse.
Nível de instrução no AM cresce
A
comparação do grau de instrução do eleitorado amazonense nos últimos
pleitos mostra o crescimento da escolarização dos eleitores do Estado.
No entanto, ainda assim, mais da metade dos eleitores sequer chegou a
cursar o ensino médio – 58,6%. O cenário nacional não é diferente. No
Brasil, 54,6% dos eleitores se encontram nessa situação.
Os
dados nacionais também revelam que a quantidade de eleitores com curso
superior, completo ou incompleto, não chega a 10%. São 9,2% de eleitores
em todo o País nessa situação. Quando são considerados os eleitores com
o ensino médio completo ou incompleto, o percentual nacional é
praticamente idêntico ao registrado no Amazonas: 35,9%.
O
crescimento da quantidade de eleitores registrados no Estado em junho
deste ano cresceu 9,6% em relação a outubro de 2010 – mês das últimas
eleições gerais. No pleito anterior, o Amazonas tinha 2 milhões de
eleitores.
Conforme
informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Amazonas tem hoje
2,2 milhões de eleitores. Desse total, 1,2 milhões, ou 55,8%, estão
concentrados na capital. Outros 44, 2% estão nos 61 municípios do
interior do Estado.
Em números
35,9%
e o percentual de eleitores do Amazonas que chegaram a cursar o ensino
médio, concluindo ou não. Houve um crescimento em comparação à última
eleição geral, quando o percentual registrado foi de 30,4% de
eleitores.
5,4%
dos eleitores do Amazonas possuem o ensino superior completo ou
incompleto. O número é maior que o da eleição de 2010, quando foi
registrado apenas 3,7% . Mesmo assim, essa ainda é a menor fatia do
eleitorado.
54,6%
é o percentual nacional de eleitores com baixa escolaridade
(analfabetos, que leem e escrevem apenas, e com o ensino fundamental
completo ou incompleto). São 78 milhões de brasileiros.
Personagem: Jackson Silva, carregador na Manaus Moderna
‘Meu voto é sério e certo’
O
carregador Jackson Silva, 54, afirmou que não esqueceu em quem votou em
2010. “Para a eleição desse ano, vou escolher uma pessoa adequada. Me
lembro exatamente de quem eu votei. Tá tudo aqui (aponta para a cabeça) e
lá em casa guardado no papel”, afirmou o trabalhador, que só aprendeu a
ler e escrever na escola. “Sou carregador aqui há 40 anos. Me criei
nesse beiradão aqui (área da Manaus Moderna)”, disse. Ele contou que
nunca se decepcionou com os políticos que votou e afirmou que é contra a
compra de votos. “No dia em que um político falar assim pra mim: ‘eu te
dou tanto para votar em mim’, eu digo, ‘não mano, meu voto não é
comprado, não’. Meu voto é sério e é certo”, disse.
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